Este meu artigo atualiza o postado em 18/08/2011
D. Nadir tem 78 anos, é pessoa muito simples, de corpo frágil. No último dia 5, preparava-se para ir, freqüentadora diária que é, às oficinas do Grupo Lótus, associação que cuida de pessoas com Parkinson. Caiu da cadeira e quebrou o fêmur da perna esquerda. Levada ao Hospital Municipal de S. Vicente, foi internada. No dia 9, o cardiologista deu-a como apta para cirurgia. Disseram-lhe que muito provavelmente seria operada no dia 11, no que acreditava candidamente pois, me disse, “tenho preferência por causa da idade”. De fato, no dia 10 foi levada à Santa Casa de Santos para avaliação, porquê é ali que os “femurados” de S. Vicente, entre outros doentes, são operados, após triagem e priorização difícil, tendo em vista a exigüidade de leitos do SUS. Examinada, foi confirmado que seu estado clínico estava adequado para a cirurgia. Mas, um simples detalhe, não havia vaga. Foi devolvida ao hospital vicentino. No dia 17 foi levada novamente à Santa Casa e, mais uma vez, devolvida, com a promessa de ser operada no dia 25. Nestas duas idas e vindas inúteis, foram vinte transferências entre camas, macas e ambulâncias. Quem já sofreu este trauma sabe a dor que ela deve ter sentido, ainda mais com os solavancos no transporte.
Operada no dia 25, foram vinte dias com o fêmur partido. Imagine-se a angústia e a desesperança de D. Nadir, tanto tempo com dor e imóvel na mesma posição! Não sou médico, mas imagino que uma tal espera deva prejudicar a cirurgia e a recuperação, além de aumentar o risco de pneumonia, que pode até matar, dada a idade. Penso que, se ela, com um caso grave, ficou esperando por 20 dias, deve haver dezenas (ou centenas?) de outras pessoas esperando há muito mais tempo. As enfermeiras que cuidam da ala onde D. Nair está parecem ser atenciosas. Mas me assustei com o conformismo da resposta delas: “O senhor tem razão de ficar bravo, mas é assim mesmo...”, me disseram, acostumadas com o inaceitável.
Santo Deus! Como pode ser normal número tão grande de pessoas esperar tanto em condições tão severas e graves? Porquê essa situação de descalabro permanece assim há tantos anos? Temos pelo menos indicadores sociais, de saúde e de gestão disponíveis para conhecer de fato a situação? Além do problema da falta de vagas, quanto tempo leva para se conseguir consulta em especialidades, ou exames indispensáveis e urgentes em casos que podem ser muito graves? Com que conforto e qualidade é feito o atendimento? Estas informações precisam ser atualizadas rotineiramente para conhecimento da população. Se a questão é de insuficiência de recursos, de quanto mais precisamos? Recursos existem, basta priorizá-los e utilizá-los com competência. O poder público está correndo para diminuir o sofrimento das pessoas que não têm como pagar a medicina particular?
A idéia do prefeito Papa de reativar e reintegrar o Hospital dos Estivadores à rede da região resolve apenas parte do problema, mas precisa ser colocada em prática rapidamente, como se faz quando procuramos por sobreviventes sob escombros, pois minutos podem significar viver ou morrer. E, de fato, os doentes estão sob escombros. Quais são as providências para acelerar ao máximo a reativação?
A propósito, o recente decreto de Alckmin permitindo que hospitais estaduais de ponta destinem até 25% de seus leitos para pacientes privados é desumano e inconstitucional. Ler, a respeito, entrevista do Dr. Arthur Chioro em www.pascoalvaz.blogspot.com.